English | Português

Letters

UMA AULA DE HERMENÊUTICA

UMA AULA DE HERMENÊUTICA

-----Original Message----- From: José de Souza Barbosa Junior Sent: quinta-feira, 6 de novembro de 2003 11:43 To: contato@caiofabio.com Subject: UMA AULA DE HERMENÊUTICA COM FERNANDO PESSOA Mensagem: Querido Caio, Já li e reli alguns livros de hermenêutica, mas nunca vi algo que sintetizasse tanto a interpretação como esse texto de Fernando Pessoa. A cada dia sou convencido mais e mais que as interpretações da vida não estão nas mãos dos teólogos, mas dos poetas. E você é um deles. **************************************************** Aqui segue o texto: O entendimento dos símbolos e dos rituais (simbólicos) exige do intérprete que possua cinco qualidades ou condições, sem as quais os símbolos serão para ele mortos, e ele um morto para eles. A primeira é a simpatia; não direi a primeira em tempo, mas a primeira conforme vou citando, e cito por graus de simplicidade. Tem que o intérprete sentir simpatia pelo símbolo que se propõe interpretar. A atitude cauta, a irônica, a deslocada – todas elas privam o intérprete da primeira condição para poder interpretar. A segunda é a intuição. A simpatia pode auxiliá-la, porém não criá-la. Por intuição se entende aquela espécie de entendimento com que se sente o que está além do símbolo, sem que se veja. A terceira é a inteligência. A inteligência analisa, decompõe, ordena, reconstrói noutro nível o símbolo; tem, porém, que fazê-lo depois que se usou da simpatia e da intuição. Um dos fins da inteligência, no exame dos símbolos, é o de relacionar no alto o que está de acordo com a relação que está embaixo. Não poderá fazer isto se a simpatia não tiver lembrado essa relação, se a intuição a não tiver estabelecido. Então a inteligência, de discursiva que naturalmente é, se tornará analógica, e o símbolo poderá ser interpretado. A quarta é a compreensão, entendendo por esta palavra o conhecimento de outras matérias, que permitam que o símbolo seja iluminado por várias luzes, relacionando com vários outros símbolos, pois que, no fundo, é tudo o mesmo. Não direi erudição, como poderia ter dito, pois a erudição é uma soma; nem direi cultura, pois a cultura é uma síntese; e a compreensão é uma vida. Assim certos símbolos não podem ser bem entendidos se não houver antes, ou no mesmo tempo, o entendimento de símbolos diferentes. A quinta é menos definível. Direi talvez, falando a uns que é a graça, falando a outros que é a mão do Superior Incógnito, falando a terceiros que é o Conhecimento e Conversação do Santo Anjo da Guarda, entendendo cada uma destas coisas, que são a mesma da maneira como as entendem aqueles que dela usam, falando ou escrevendo. Fernando Pessoa
We use essential cookies and technologies in accordance with our Privacy Policy and, by continuing to browse, you agree to these conditions.
OK